Atraídos
por uma ‘vida melhor’, haitianos dão de cara com preconceito e abusos no Brasil
Geledés Categoria
» África e sua diáspora
(Photo by Michel Filho/Globo via Getty Images)
“Se você quer, pega. Se não quer, não quer”. Foi
assim que Alix Mustivas, de 26 anos, foi tratado pelo patrão após se machucar
enquanto trabalhava na construção civil. Após fraturar a coluna o braço em dois
lugares durante o trabalho – sem carteira assinada – o dono da empresa ofereceu
R$ 300 ao jovem. “Eu disse que minha vida não valia R$ 300”.
no HuffPost Brasil por Gabriela
Bazzo
Mustivas, que teve o apoio de
entidades sindicais catarinenses para receber, durante um mês, auxílio do INSS,
conta que ficou dois dias sem levantar e andar. “Depois de uma semana consegui
caminhar e levantar sozinho”, afirma.
Haitiano, ele está há mais de um ano entre
Curitiba e Santa Catarina. Mustivas veio ao Brasil em busca de oportunidades
melhores do que as que encontrava no país de origem, que ainda se recupera de
um devastador terremoto,
que atingiu a nação em 2010.
“Eu trabalhei em um condomínio em
Santa Catarina, mas depois da temporada não precisavam mais de serviço”, conta
ele, que então conseguiu um novo emprego, no setor de construção civil,
sem dificuldades.
“O chefe pagava R$ 70 por dia,
mas não queria assinar a carteira de trabalho.Ele dizia que ia
assinar na semana seguinte, mas nunca assinava. Eu estava em uma situação que
tinha que pagar aluguel, ajudar minha filha, não podia ficar parado”, conta
ele, pai de uma garota de 7 anos que mora com os avós maternos no Haiti.
Atualmente, ele mora em Curitiba
– “achei que lá teria mais gente para cuidar de mim”, contou – onde tem uma
banda e trabalha como segurança em uma universidade particular.
Mustivas é, de acordo com dados
da Polícia Federal, um dos 65 mil haitianos que chegaram ao Brasil entre 2011 e
novembro de 2015.
Não há dados precisos sobre
quantos haitianos vivam em Santa Catarina, mas as estimativas giram
em torno de 6.000 pessoas.
“O indicativo que se tem é que em
2013, segundo o Ministério do Trabalho e Emprego, os haitianos tornaram-se o
grupo de trabalhadores imigrantes em SC, de maior presença no mercado formal”,
explica a professora Gláucia Assis, coordenadora do Observatório das Migrações de Santa Catarina,
ligado à UDESC.
Em Santa Catarina, nos cinco
primeiros meses do ano passado, foram emitidas 2.259 carteiras de trabalho para
haitianos, mais do que o dobro do registrado ao longo de 2014: 986.
Gláucia aponta para a
configuração de redes sociais, que fazem com que um imigrante “puxe” o outro
para determinada cidade.
“Esse
incremento da presença de haitianos no estado se deve ao fato de que a maioria
quando chegou encontrou trabalho, antes da intensificação da crise econômica, e
a principalmente ao fato de que os imigrantes uma vez estabelecidos e
encontrando trabalho tendem a passar essa informação a amigos e parentes que
vem para onde já há algum conhecido estabelecido e posso ajudar a encontrar
emprego e moradia.”
Foi a perspectiva de um
emprego e a possibilidade de avançar nos estudos que levaram Alexandre
Bladimy, de 28 anos, a Balneário Camboriú. Antes, ele trabalhou em um
frigorífico no Rio Grande do Sul.
“Foi um momento muito duro para
mim, pois meu coração não compartilha com esse tipo de lugar, com sangue, com
sofrimento. Tenho um coração muito sensível”, conta ele, que trabalhou por um
ano e pediu para ser mandado embora.
Após um ano sem emprego, o jovem
começou a cursar Relações Internacionais na Universidade do Vale do Itajaí, onde trabalha na
Secretaria de Inclusão, com o atendimento a conterrâneos.
Ele, que trabalhava como gerente
de uma escola técnica no Haiti e dava aulas de idiomas, critica a falta de
políticas públicas voltadas aos haitianos.
“O governo está promovendo uma
política externa para trazer mais haitianos para o Brasil, mas não tem nada de
políticas públicas para os haitianos aqui”, conta ele, que afirma ter sido
convidado para vir ao país, mesmo com um bom emprego no Haiti , e agora
se prepara para voltar ao país de origem.
“Lá não
estava muito ruim para mim. Eu ganhava bem, tanto que paguei minha passagem.
Uma grande parte dos haitianos vem para procurar trabalho, mas eu tinha uma
vida boa lá. O que me motivou a vir foi a boa oferta, eu esperava oportunidades
melhores aqui, principalmente em avançar nos estudos.”
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