Leci
Brandão: A força da mulher na luta contra o racismo
Publicado
há 1 dia - em 9 de março de 2016 » Atualizado às 15:20
Categoria » Mulher Negra
Categoria » Mulher Negra
Neste Dia Internacional da Mulher, quero relatar
uma experiência que tive há muitos anos quando fui procurar meu primeiro
emprego. Era 1966, recém-formada pelo Colégio Pedro II, no Rio de Janeiro. Era
hora de ter carteira assinada. Desavisada sobre as armadilhas do racismo
institucional, bati de porta em porta com um currículo embaixo do braço
seguindo os anúncios que exigiam muitos requisitos, inclusive a tal “boa
aparência”.
Por Leci
Brandão Do Vermelho
A carteira assinada só veio
depois que relatei a minha busca a uma amiga que me explicou o que a tal “boa
aparência” significava. Ela disse que eu nunca preencheria nenhuma vaga se não
fosse por meio de uma indicação ou algo parecido.
Hoje, não vemos mais anúncios
pedindo a “boa aparência”, mas isso não quer dizer que a vida ficou muito mais
fácil para as mulheres negras. Hoje, enquanto deputada
estadual, recebo denúncias de mulheres que não ascendem em suas carreiras,
principalmente no mundo corporativo, por causa de seu cabelo crespo, ou que
sofrem assédio para que se adaptem a um padrão estético considerado aceitável.
O racismo é uma forma de opressão
perversa e cruel. Ele garante a manutenção de estruturas repressivas e
autorizam atrocidades como o genocídio da juventude
negra e a exploração do nosso trabalho em troca dos salários mais
baixos e nas piores condições.
Neste 8 de Março, Dia Internacional da Mulher, data de luta e
reflexão, não podemos ignorar a desigualdade racial e de gênero que atinge a mulher negra,
pois, se nossa luta por emancipação é internacional, também é certo que ela
deve considerar a questão racial. Precisamos, sim, de um feminismo
negro. A boa nova é que são evidentes os sinais de crescimento desse
feminismo no Brasil. Nas ruas já se fazem notar
os cabelos crespos ou trançados e turbantes coloridos. Para os que pensam que
essa mudança estética é algo supérfluo, um recado: não se trata apenas de
cabelo. Estamos falando de protagonismo, de poder e de política.
Estamos colhendo os frutos de décadas
de luta do movimento negro somadas às políticas públicas inclusivas iniciadas
em 2002, com a eleição de Lula, como a instituição do ProUni (Programa
Universidade para Todos) e das cotas para negros e indígenas nas universidades.
Porém, continuamos três degraus abaixo na escada da igualdade racial e de
gênero. Para citar apenas um exemplo dessa disparidade, 61,6% das 6,5 milhões
de mulheres que exercem o trabalho doméstico remunerado no Brasil são negras,
pobres e com baixa escolaridade, a maioria sem vínculo trabalhista formal; por
outro lado, na Câmara dos Deputados, as mulheres negras são pouco mais de 2%.
O racismo
é mantenedor de estruturas de poder e não podemos desconsiderá-lo em nenhum
momento.
Hoje temos algumas leis que nos
amparam e um Estatuto da Igualdade Racial, mas a nossa maior conquista
hoje é o nosso fortalecimento coletivo: “Uma sobe e puxa a outra”.
É puxando umas às outras que
vamos ocupar os espaços de poder. Não temos como mudar um Congresso
reacionário, que ataca as mulheres, principalmente as negras, se não
participarmos da política, se não elegermos cada vez mais mulheres que falem e
defendam as causas que realmente farão uma diferença positiva em nossas vidas.
Estamos vivendo a ameaça de uma
democracia sufocada. Reelegemos a presidenta Dilma
e é fundamental que as comemorações deste 8 de Março sejam marcadas pela defesa
da democracia e contra o retrocesso. Hoje, esta é a nossa pauta mais urgente.
Temos que garantir essa democracia, pois, sem ela, nossas lutas não vão
avançar.
2016 é ano eleitoral e a pergunta
que faço é: quantas mulheres pretendemos eleger nas próximas eleições? Quantas
mulheres negras?
Eu conheço as dificuldades das
mulheres, principalmente, das mulheres das pontas, das favelas, das periferias,
das ocupações e dos quilombos. Conheço de perto o machismo e o racismo porque
sempre lidei com eles. Por isso mesmo sei que se não estivermos no Poder, de
verdade, nossas lutas serão ingratas.
Se não colocarmos mais mulheres
negras e das periferias nos representando nas câmaras municipais, prefeituras,
governos estaduais, assembleias legislativas, na Câmara Federal e no Senado,
não vamos avançar.
Nossa luta por emancipação e mais
desenvolvimento continua atual, mas não haverá mudanças se a luta das mulheres
também não for pela superação do racismo.
Nenhum direito a menos!
Nenhum passo atrás!
Viva o 8 de Março!
Leia a matéria completa em: Leci Brandão: A força da mulher na luta contra o racismo - Geledés http://www.geledes.org.br/leci-brandao-forca-da-mulher-na-luta-contra-o-racismo/#ixzz42XlNk6Ys
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